O claim Red Bull dá-te asas é já uma assinatura indissociável da marca de bebidas energéticas austríaca. A nível mundial, ninguém personificará melhor essa afirmação da marca do que Felix Baumgartner, mais conhecido como Fearless Felix, que tem saltado em queda livre de locais como o Cristo Redentor, no Rio, com o patrocínio do touro vermelho. Agora, naquela que é uma das acções mais ambiciosas e arriscadas da marca, o Projecto Red Bull Stratos, o desportista prepara-se para quebrar um recorde com 50 anos ao saltar de uma altitude de mais de 36.500 metros e tornar-se o primeiro homem a superar a barreira da velocidade do som com o próprio corpo. Esta é uma das iniciativas lançadas pela Red Bull, marca cujo posicionamento aposta numa forte associação a desportos radicais e eventos arriscados, desde patrocínios a desportos de Inverno e Fórmula 1, passando por windsurf, motociclismo, escalada, queda-livre, cliff-diving ou a sua própria competição de aviões, a Red Bull Air Race. No caso de Portugal, as asas não vão, literalmente, levantar voo este ano tendo em conta que a Air Race, agendada para os dias 4 e 5 de Setembro, foi cancelada. Agora que um dos seus eventos com maior impacto mediático foi anulado, é caso para perguntar se a sua notoriedade vai sair afectada e entrar numa queda livre semelhante à de Felix ou se, pelo contrário, há todo um conjunto de eventos para além da Air Race com capacidade para manter a imagem da Red Bull em pleno voo. Isto porque esta não é uma marca que leve a cabo largos investimentos em publicidade nos meios tradicionais, assentando a sua comunicação e construção de imagem nos eventos e acções de activação. Exemplo sintomático dessa opção estratégica é o caso do mercado brasileiro, onde a marca contratou em Janeiro a agência de publicidade Loducca, com um briefing em que apenas 20 por cento das acções se destinarão a meios tradicionais.
A ponta do icebergue
“A Red Bull Air Race é um evento importante na nossa longa lista de eventos e acções, mas o mundo Red Bull é muito mais do que apenas a Air Race”, faz questão de frisar André Henriques de Carvalho, director de marketing da Red Bull Portugal. Para o responsável de comunicação da marca para o mercado nacional, o evento que agora foi cancelado é apenas a ponta do icebergue: “Desde 1999 que temos realizado uma série de eventos e iniciativas inovadoras em Portugal. A lista é enorme”, refere, apontando iniciativas como o Red Bull Air & Water – International Snowboard Jump Contest (Setembro de 1999), o Red Bull Street Style (futebol freestyle em Março de 2010) ou o “primeiro evento de freestyle motocross da marca a nível mundial, o Red Bull X-Invicta em 2000”. André Henriques de Carvalho destaca ainda as cinco edições do Red Bull Downtown, “evento mundial de downhill urbano que ganhou asas e se transformou no Lisboa Downtown”, o Red Bull Creativity Contest (criação de obras de arte a partir de latas de Red Bull), o Grande Prémio Red Bull e o Red Bull Flugtag – O Dia das Asas (com máquinas em terra ou voadoras construídas pelos participantes), o Red Bull Spot Seekers e a Red Bull Local Hero Tour em skate, inúmeras actividades da Red Bull Music Academy, a última das quais o RBMA Radio Pirate Popular Soundclash que decorreu durante o Santo António em Lisboa. “O mundo e o lifestyle das pessoas alteraram-se muito nos últimos vinte anos. Existe, cada vez mais, uma grande necessidade das pessoas em viver a vida ao máximo, quer em termos profissionais, quer em termos pessoais. Este estilo de vida exige mais tanto do corpo como da mente das pessoas e é aí que entra Red Bull”, explica André Henriques de Carvalho para justificar a aposta da marca neste tipo de eventos.
No entanto, além dos eventos e acções, a estratégia da marca é mais do que isso, assentando em mais três pilares: “A comunicação, onde além da comunicação de conteúdos Red Bull se inclui a publicidade, o consumer collecting, com as Wings Teams (carros com uma lata de Red Bull gigante), que dão a experimentar Red Bull a potenciais consumidores e o patrocínio a atletas”, explica o director de marketing da marca em Portugal, que garante que o cancelamento da Air Race não vai ter consequências sobre os outros eventos que estão planeados no contexto da estratégia da marca para o mercado português: “O mundo Red Bull é imenso e existem uma série de acções a decorrer e planeadas para o curto, médio e longo prazo que, na altura certa, serão comunicadas”, assegura, sem avançar mais detalhes. “Aquilo que os consumidores podem esperar da Red Bull é uma contínua e forte aposta na inovação em todas”, diz. E sublinha: “A estratégia da Red Bull mantém-se. Sempre.”
O mercado português dá-te asas?
Embora a marca demonstre apostar no mercado português, com a realização de várias acções para lá da Red Bull Air Race, a verdade é que o cancelamento de uma das suas iniciativas mais mediáticas levanta inevitáveis questões sobre a importância deste mercado para a estratégia e plano de negócios global da insígnia. Afinal, Portugal é um mercado prioritário para a Red Bull? “Considerando todas as operações mundiais da Red Bull, Portugal é o terceiro país com mais alta quota de mercado, temos dos mais elevados níveis de distribuição numérica e ponderada nos diversos canais, e do ponto de vista da marca temos igualmente valores recorde no que toca a awareness e trial”, afirma André Henriques de Carvalho, assegurando que “qualitativamente, é indiscutível a relevância da nossa operação e, com frequência, constituímos best practices no grupo”. Ainda assim, o mercado português constitui “um volume que representa cerca de um por cento do volume mundial do grupo”, situação que se justifica pela “dimensão da população e, sobretudo, o baixo consumo per capita que Portugal ainda regista nas bebidas com e sem gás, comparando com os restantes países”. Perante a parca contribuição do mercado português para o bolo da marca a nível global, o cancelamento do Red Bull Air Race poderá ser um prenúncio de uma mudança de estratégia? Questionado sobre a manutenção do investimento no mercado português e sobre se este cancelamento implica reajustamentos na estratégia da marca, André Henriques de Carvalho é claro: “A estratégia mantém-se, mas obviamente que o cancelamento de um evento desta dimensão e visibilidade para a marca faz com que tenham que haver ajustes no plano de actividades. É isso que estamos a fazer”, diz, escusando-se a avançar mais pormenores.
- Cancelamento polémico
O cancelamento da Red Bull Air Race no Douro começou, desde logo, por estar envolto em polémica com duas partes a apontar razões divergentes para o cancelamento da prova. A primeira entidade a avançar com a notícia foi a Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia, afirmando, em comunicado, ter sido “informada pela Red Bull Air Race do cancelamento da prova em Portugal, evocando motivos de natureza económico-financeira ligados à crise internacional”. No seguimento desta justificação, contactado pelo M&P, o departamento de marketing da Red Bull em Portugal respondeu através de comunicado da organização Red Bull Air Race GmbH, que apontava motivos díspares. “Esta decisão resultou do inesperado atraso no processo que tinha como objectivo último alcançar um novo acordo para o destino da corrida”, justifica a organização, acrescentando que “embora o processo negocial e de apoio à iniciativa com o Turismo de Portugal e as cidades associadas de Lisboa, do Porto e de Gaia tenha decorrido de forma positiva, a organização considera que se esgotou a margem de tempo necessária para colocar de pé um evento desta complexidade, dimensão e qualidade”. A Câmara de Gaia, contudo, avança com algumas acusações no comunicado que emitiu, garantindo que “reitera poder assumir todos os compromissos que acordou, incluindo os financeiros, para a realização desta prova, mas manifesta a sua estranheza por este desfecho, só possível pela intervenção leviana de responsáveis do Turismo de Portugal e de alguns autarcas que revelaram, em todo este processo, uma falta de profissionalismo e pensaram exclusivamente no benefício das suas agendas políticas próprias”.
Acusações que se seguiram, desta vez do lado do Turismo de Portugal e dirigidas à organização da Red Bull Air Race. O Turismo de Portugal diz ter sido “surpreendido pela decisão unilateral da organização da Red Bull Air Race de não realizar a edição da prova que estava prevista para o Porto em Setembro próximo”. Contrariando a justificação da marca promotora, a entidade assegura que “o Turismo de Portugal, as câmaras municipais de Lisboa, Oeiras, Porto e Gaia e a Associação de Turismo de Lisboa (ATL) cumpriram escrupulosamente com todas as obrigações que tinham sido aceites” e acusa a Red Bull de demonstrar, com esta decisão, “falta de fiabilidade” enquanto promotor.
Confrontado com estas acusações, André Henriques de Carvalho limita-se a dizer que “a Red Bull sempre manteve e mantém uma óptima relação com todas as entidades envolvidas no processo, sejam estas públicas ou privadas, e em especial com o Turismo de Portugal”. Ainda assim, aproveita para lembrar que “a Red Bull Air Race teve e tem um papel fulcral na projecção da marca Portugal no estrangeiro, com ligação da imagem do país a características chave como inovação, velocidade, precisão, profissionalismo e lifestyle com centenas de horas de transmissão televisiva sempre com imagens do Douro, Porto e Gaia como pano de fundo para mais de 100 países”.
[Meios & Publicidade 23 de Julho de 2010]
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